quinta-feira, 3 de março de 2011

Pacto de Monstros

A capa é mais bonita pessoalmente



Recebi ontem, uma terça-feira às portas de 2010, a coletânea Pacto de Monstros, gentilmente enviada pelo meu amigo Daniel Folador Rossi. Como é de praxe na comunidade Escritores de Fantasia e FC do Orkut, aquele que ganha um livro devolve uma resenha. E aqui estou. Sempre fui da opinião de que, se eu não tenho algo bom para falar, é melhor ficar na minha. Não é um bom princípio para um resenhista crítico, mas como não há nenhum aqui – nem pretensão para tanto – fico com ele mesmo. Valendo-se deste espírito, fico à vontade para falar também das coisas ruins.

Lançado pela editora Multifoco através do selo Anthology, o primeiro ponto de interesse de Pacto de Monstros é o visual do livro, capa e encadernação. Quando vi a capa da antologia espalhada pela rede, confesso que não achei atraente. Tenho de dar o braço a torcer ao tê-lo em mãos: a capa do livro até que é bonita. Os tons de cinza são muito mais vivos do que a tela do computador faz parecer. A ilustração fica bem mais impressionante. A impressão do texto, no entanto, deixa a desejar: apagada demais, o que dificulta um bocado a leitura, principalmente para aqueles que, como eu, não enxergam lá muito bem. As ilustrações de Zambi são competentes, algumas bem legais, como a do conto Colônia- Estágio I. Acredito, porém, que criaria mais clima se a arte fosse feita em contrastes de preto e branco. O cinza me soa Coleção Vaga-Lume demais. Idiossincrasia, apenas.

O primeiro conto da antologia é V, de Alex Lopes. Não cumpre a intenção do livro, que é evocar o terror aos moldes de Poe e Lovecraft. Os monstros são iluminados demais, o que causa pouco efeito de terror. O foco nos diálogos e a falta de detalhes descritivos não permitem a criação da atmosfera certa. Não funciona como conto de abertura. O que não quer dizer que o autor não tenha seus méritos.

A Chama da Vela, de Heitor V. Serpa. Boa escolha para o título. Boa atmosfera, mas sem muitos detalhes e reticências em excesso. O plot me lembrou um filme de 1992, O Mistério de Candyman, que por sua vez se baseia em Clive Barker. O último parágrafo toma algum fôlego.

Arquivo 13, de Adriana Rodrigues. Só me pareceu um tiquinho inverossímil doze pessoas serem mortas, uma por noite, e a faculdade continuar aberta, só com um vigia. A narrativa é razoável, mas quando chega na metade fica um pouco confusa: é preciso reler algumas passagens para entender quem fez o quê.

Caçador de Aberrações, de Andréa Cisne. Conto do ponto de vista de um vampiro que, para quem tem trezentos anos de idade, é um bocado bobão. Aqui não há clima de terror, mas de humor. Após ficar o dia todo num porta-malas, o vampiro menciona o nome de seu salvador, que se surpreende. Quando inquirido por este sobre o fato, de todas as explicações possíveis, racionais e perfeitamente aceitáveis, o vampiro meio que se atrapalha e deixa transparecer que esconde alguma coisa. E ainda acaba trabalhando para o sujeito, resmungando o tempo todo. Também tem um lobisomem na história. É engraçado, mas não espere por sustos.

Colônia – Estágio I, de Misael Espírito Santo e Jota Fox. Uma idéia interessante. Epílogo desnecessário, na minha opinião.

Condor Zumbi (o pai da noite dos mortos), de Ghad Arddhu. Bem escrito, algumas partes evocam momentos de pura tristeza. A parte em itálico é um pouco cansativa de ler devido à impressão lavada. Na parte da lenda, tem-se a impressão de estar lendo um tribebook de Lobisomem: O Apocalipse.

Fábula Imoral, de Luiz Hasse. Um longo diálogo, pouco descritivo, entre um jovem e o Diabo. Humor negro, mas não terror. Divertido.

Glare, de José Roberto Vieira. O autor em breve lançará seu romanceBaronato de Shoah pela Draco – e, como lhe disse numa ocasião, escreve muito rápido. Bom, seu trabalho aqui é um conto de vampiro. A narrativa é dramalhesca, o que combina com a criatura. Trata-se de um jogo de caça. Gostei das indicações do clima no princípio de cada parte, como num roteiro. O último parágrafo é uma citação direta de Nietzsche.

Inércia, de Frank Bacural. Bom conto, com uma idéia perturbadora, principalmente pelo inteligente recurso (do qual senti falta em muitos contos) de não explicar nada. Quanto menos se mostra do monstro, menores as chances de se ver o zíper da fantasia. Bacural vale-se deste artifício e deixa o leitor – eu, no caso – perguntando o que diabos foi aquilo. Lembrou um pouco Colin Cosmo e os Supernaturalistas.

Kenneth McSmith, de Daniel Folador Rossi. Ritmo objetivo. Um pouco seco, é verdade, mas sem abrir mão das descrições. Bom conto, uma mistura da saga Newcastle de John Constantine (Hellblazer #11, Vertigo #5 no Brasil) com As Ursas, de Moacyr Scliar, e pitadas de Arquivo X, ou Fringe ou mesmo Bones.

La Sayona, de Frank Félix. Diálogos diretos e pouca descrição, o que muito crítico por aí aponta como defeitos do jovem autor pós-geração 90. Um campônio venezuelano chamado Harold Elric soa mais improvável que o fantasma, que posso jurar já ter visto num episódio de Supernatural. No entanto, é um dos contos que mais capta o espírito da antologia.

M3do, de Mushi-San. Já tive oportunidade de ler este antes. A linguagem utilizada para o robô ficou bem legal. O conto é bom, mas ficaria melhor numa coletânea de ficção científica. Infelizmente, o robô não pintou a parede com o sangue do moleque mimado filho da puta.

Museu do Terror, de Duda Falcão. Também já havia lido. Nenhum terror criado pela imaginação humana é capaz de superar o terror real do qual somos capazes. Essa é a mensagem.

O Espírito do Lobo, Jones V. Gonçalves. Boa redação, mas um pouco previsível.

O Leitor e o Menino do Porco, de Félix Maranganha. Outro que tive a oportunidade de ler antes. Regionalista, seu conto é uma pequena pérola. Mas também não é de terror.
O Preço, de Monica A. Sicuro. Mesmo título de um conto de Neil Gaiman – que também tem um gato. O conto de Monica traz uma versão sem sangue de Barthory, e uma carga suave de erotismo. Gostei do gato ser branco, escapando do preto-padrão.

Sonho de Verão, de Deborah Brandão. Mmm... Exatamente como o título, o conto soa mais como uma fantasia de moça romântica que como uma narrativa de terror. E usa um tipo de final satirizado em Sérgio Aragonés massacra a Marvel. Também utiliza o recurso da falta de explicação, o que demonstra que a autora está encontrando o rumo.

Poe (in memorian), de Rúbia Cunha. Sombrio, melancólico. Bom conto. E tem o corvo.
Apesar da irregularidade dos contos, onde claramente se vê que nem todos foram escritos especificamente para a coletânea, é bom ver uma geração de jovens autores buscando espaço. Chato que haja tão pouca divulgação dos livros finalizados. Uma meta para 2010, quem sabe.


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